Nina by Nina

Sou caipira. Nasci em um lugar remoto do Estado de São Paulo. O ano era 1958 e o mês era novembro e o dia era 23 e caiu num domingo. A hora presumida era cinco e trinta da tarde. Nasci quase na hora da Ave Maria.


Cresci em quintais pontilhados de árvores frutíferas, balanços e circos que armávamos para brincar com os amigos. Havia muitos tios e muitos primos. A avó era chamada de madrinha e o avô, de vovô. Para os parentes não dizíamos bom dia, boa tarde ou boa noite. Era benção vovô, por exemplo. No universo ao meu redor havia um exemplar de cada tipo que compõe uma pequena comunidade.


Tinha o Mudinho (porque era baixinho) e tinha o Mudão (porque era alto e provavemente mais velho do que o outro). Tinha a Judite, que era filha moça de um casal já idoso. Eles eram portugueses. Ela era louca e tinha um bigode preto. Ela se apaixonava pelos maridos das outras e batia nessas quando calhava. Todos iam à missa. E os outros iam à igreja dos “crentes”. Ou era católico ou era crente. Tinha uma prostituta, a Maura. O cinema era só depois da missa e era o mesmo filme sexta, sábado e domingo. Na missa eu me deleitava. Olhando as “modas” das moças. Eram os anos 60.


E tinha a D. Isaura! D. Isaura com suas saias de babados e floridas. Com seus dedos cheios de anéis de fantasia. Com laços no cabelo, igual à D. Baratinha. D. Isaura com seu rouge (não se usava blush ainda) na maçã da cara preta. Ela era bizarra, mas eu admirava a combinação descombinada de cores. Minha mãe achava, assim como a maioria, aquilo tudo de muito mau gosto. Mas eu não. Eu adorava.


Eu era uma garota bossa nova.
E é por isso que agora, quando dou à luz a esta cria tardia, que eu invoco essa lembrança de infância. De todas as buscas que fiz no meu google inconsciente para achar a origem da minha fascinação por panos, trabalhos manuais e afins, me veio a imagem da D. Isaura. A pessoa é mesmo para o que nasce.

Ah, e como o mundo é plano, hoje eu moro em Porto Alegre/Rio Grande do Sul/Brasil

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